Por que ainda hoje um beijo pode causar repulsa e espanto?
Provocando uma reflexão acerca do tema, retorna na quinta feira, 02/10, ao palco do icônico Teatro Ipanema Rubens Correa, o polêmico espetáculo “Essa peça tem beijo gay”.
No texto escrito por Leandro Fazolla e Rohan Baruck, com direção de Dadado de Freitas, o que poderia ser um ato cotidiano gera um dilema sobre limites pessoais e o impacto das escolhas, em um tempo em que o amor entre iguais ainda permanece sob constante suspeita e até vigilância.

PÚBLICO X PRIVADO
A montagem questiona quais afetos podem ser visíveis, quais ainda são interditados e a noção de público e privado, quando decisões aparentemente comuns podem ter desdobramentos maiores do que se pode imaginar.
“Nos últimos tempos, fomos atravessados por diversas notícias em que o chamado ‘beijo gay’ estava no centro da discussão, desde a censura do ex-prefeito Crivella na Bienal do Livro de 2019 até o alarde feito na imprensa sobre um beijo gay nas novelas. E pensamos que este poderia ser um tema a partir do qual poderíamos abordar nossas vivências. Então, desenvolvemos um conflito em que os dois personagens pudessem tensionar sua relação e pensamentos sobre a própria comunidade LGBTQIAPN+”, resume LeandroFazolla.

O BEIJO
A partir de uma foto de beijo circulando nas redes sociais, que provoca um imenso conflito, o texto se abre para novas camadas, flertando com a autoficção, trazendo conflitos comuns aos autores, sobretudo a partir de suas origens em São João de Meriti, na Baixada Fluminense.
A dramaturgia revela como a visão da sociedade sobre os corpos dissidentes interfere nas vidas e formas de se colocar no mundo.
“Entre naturalização e fetichização, haver uma categoria ‘aceitável’ ou ‘permissível’ de beijo é um sinal do retrocesso que estamos vivendo. Pesquiso a cena dissidente e a personagem ‘bicha’ nas narrativas contemporâneas, e ter que discutir o beijo como esse fantasma e num lugar de urgência social me inquieta como artista”, pondera o diretor Dadado de Freitas, que possui longa trajetória na cena queer, tendo dirigido peças como “3 maneiras de tocar no assunto”, de Leonardo Neto; “Balé Ralé”, de Marcelino Freire; e o “Homossexual ou a dificuldade de se expressar”, do autor franco-argentino Copi, entre muitos outros.

O BEIJO DE NELSON RODRIGUES
O espetáculo também olha pra trás a partir de um diálogo com a peça “O Beijo no Asfalto”, de Nelson Rodrigues, já que a polêmica sobre o tema parece estar retrocedendo a partir de um aumento cada vez maior do conservadorismo no país e no mundo.
“A homofobia e o sensacionalismo que pautam nossos beijos hoje são os mesmos que interferem radicalmente na vida dos personagens rodrigueanos. A gente acredita ter avançado nessa discussão, mas será mesmo? Olhar pro passado nos ajuda a refletir sobre o que mudou e a projetar o que vem pela frente”, aponta Rohan Baruck.
O AMOR DISSIDENTE
Embora se anuncie por um beijo, “Essa Peça tem Beijo Gay” é um espetáculo que se propõe a falar do amor e de suas idiossincrasias. “O amor numa relação homoafetiva é tão amor quanto em qualquer outra relação. No entanto, ainda é visto como um tema das dissidências, um tema maldito. Então criamos uma imaginação distópica de um futuro não muito distante em que este beijo e estas relações dissidentes permanecem sob intensa vigilância. É uma espécie de ‘e se’ que provocamos através da peça. E se essa onda conservadora ganhasse contornos ainda mais radicais? Nosso público poderá se afetar por personagens em um momento limite que causa uma montanha-russa de emoções? E é apenas no meio disso tudo há um beijo gay”, atestou Dadado.
Sob direção de Dadado de Freitas, o texto escrito pela dupla de atores Leandro Fazolla e Rohan Baruck, leva ao palco a discussão de um casal que, diante uma censura indireta, debate sobre os quão visíveis ou privados podem ser seus afetos.
SERVIÇO:
“Essa peça tem beijo gay”.
Teatro Ipanema Rubens Correa
Rua Prudente de Morais, 824 – Ipanema, Rio de Janeiro
Dias 2 a 5 de outubro (quinta a sábado, às 20h; e domingo, às 19h)
Classificação Indicativa: 14 anos
Duração: 70 minutos
Gênero: Drama
Ingressos na bilheteria do teatro
FICHA TÉCNICA
Idealização, dramaturgia e atuação: Leandro Fazolla e Rohan Baruck
Direção artística e supervisão dramatúrgica: Dadado de Freitas
Direção de movimentos: Maurício Lima
Direção Musical: Bèá Ayòóla
Cenografia: Maurício Bispo
Figurino: Flávio Souza
Iluminação: Ana Luzia Molinari de Simoni
Direção de produção: Stephany Lopez
Operação de Som: Nilda Andrade
Operação de Luz: Rafa Domi
Fotografia: Higor Nery
Instagram: @essapecatembeijo
Fotos/Crédito: Higor Nery